domingo, 5 de junho de 2011

Boardwalk Empire - O Império do Contrabando

Ver e enxergar são duas ações parecidas, semelhantes, mas bem diferentes na realidade, pois envolvem qualidades como percepção e observação. Quem trabalha com imagem diariamente, em cinema ou televisão, sabe bem disso. Por isso, para analisar a série "Boardwalk Empire", sucesso da HBO, convidei Fernando Collaço, um jovem estudioso deste assunto e excelente conhecedor dos muitos princípios e linguagens que podem ser utilizadas na produção dos melhores audiovisuais do momento. Acompanhe seu post e bom entretenimento:

Texto de Fernando Martins Collaço:

Martin Scorcese nunca escondeu sua predileção pela temática do submundo do crime em sua trajetória audiovisual. Com Goodfellas (1990), baseado no livro Wiseguy de Nicholas Pileggi, voltou seu olhar para a ascensão e a queda de três gânsters ao longo de três décadas. Com Cassino (1995), novamente adaptando Pileggi, o diretor trouxe a história de Frank Rosenthal, que dirigiu os cassinos Stardust, Fremont e Hacienda para a máfia de Chicago entre as décadas de 70 e 80.

Com os Infiltrados (2006), filme que lhe rendeu o Oscar de Melhor Diretor, inspirado no filme chinês Conflitos Internos (2002) de Wai-Keung Lau e Alan Mask, mostrou-nos um policial infiltrado em um poderoso braço da máfia irlandesa de Boston, a qual também consegue infiltrar alguém entre os policiais. 
Scorcese é considerado um dos maiores realizadores em ação, aliando fortes narrativas a um estilo de filmagem clássico, com leves traços pós-modernos.

Com Boardwalk Empire – O Império do Contrabando, minissérie da HBO de 2010, Scorcese reencontra a temática da máfia. Responsável pela produção e direção do primeiro episódio, o diretor une-se à Terence Winter, um dos roteiristas da Família Soprano, que ficou responsável pela adaptação do livro Boardwalk Empire: The Birth, High Times, and Corruption of Atlantic City, de Nelson Johnson.
A minissérie traz como pano de fundo a escalada da cidade de Atlantic City, New Jersey, rumo ao status da Meca dos jogos de azar, bordéis e drogas, levando-a conseqüentemente à transformação em uma cidade-símbolo do crime organizado, este velado sob uma aliança entre mafiosos e políticos em busca de benefícios próprios.

O fio condutor da trama é a trajetória de Enoch Nucky Johnson, interpretado por Steve Buscemi, papel que lhe rendeu o Globo de Ouro de Melhor Ator, um dos três políticos que controlavam a cidade na época. Nucky, visando a obtenção de votos, adere à proibição das bebidas alcóolicas perante a sociedade, porém, nos bastidores, utiliza a aprovação da Lei Seca para lucrar com a logística e venda ilegal do álcool, feito que lhe rende um grande império monetário.

A constituição desse império e suas conseqüências é o que vai mover a trama, a qual ainda conta personagens como Jimmy (Michael Pitt), protegido de Nucky e quem dá o pontapé inicial para a constituição do império, Margareth (Kelly McDonald), mulher a quem Nucky se torna solidário perante os abusos que sofria do marido, Van Alden (Michael Shannon), que passa a investigar mais a fundo as atividades mafiosas, dentre outros. Além disso, há uma mistura de personagens fictícios à gângsteres reais que fizeram nome na época, como Arnold Rothstein (Michael Stuhlbarg) e Al Capone (Stephen Graham).

A veiculação da minissérie trouxe para a HBO a melhor audiência desde Deadwood (2004), tendo sida assistida por 4,8 milhões de espectadores nos EUA, fazendo jus ao status de grande produção, na qual foram investidos cerca de 90 milhões de dólares. Dentre os atrativos que a tornaram um sucesso após 12 episódios exibidos estão:

a) uma direção de arte minuciosa com figurinos e objetos de cena que refletem a extensa pesquisa bibliográfica e iconográfica realizada pela equipe de produção sobre o período

b) movimentos de câmera constantes e bem executados, típicos da produção de Scorcese, que dentre outros, apresentam em planos-sequências as locações onde a ação toma forma.

c) uma trilha sonora que resgata inúmeros sucessos da difusão radiofônica da época e outros sucessos recentes. Dentre as canções estão: Resurrection (The Temper Trap), Straight Up and Down (The Brian Jonestown Massacre) e 60 Feet Tall (The Dead Weather).

d) uma edição ágil, que aposta na montagem paralela e trânsito livre pelo tempo cronológico, no constante congelamento de frames sobrepostos por vozes da próxima seqüência. (no melhor estilo de Tarantino ou Guy Ritchie) ou mesmo táticas do cinema mudo, do qual Scorcese é fã declarado, como o fechamento da cena com um efeito de íris.

A minissérie prepara sua segunda temporada e em breve estréia pela HBO. Nesse meio tempo, podemos rever os episódios ou mesmo aproveitar toda a filmografia de Scorcese, uma verdadeira aula de cinema.


Fernando Martins Collaço, especial para o TV tudo isso

Fernando Martins Collaço é midiálogo, editor de vídeos, pesquisador na área da televisão e minisséries, colunista eventual e fotógrafo de moda nas horas vagas. Tenho a honra de trabalhar com ele no Núcleo Corporativo da Central Record de Comunicação.

Crédito de imagens: Divulgação HBO e youtube

Clique no link abaixo e assista ao trailer oficial de Boardwalk Empire:

2 comentários:

  1. Olá Fernando. Maravilhoso este seu comentário e análise. Também gosto muito desta série e da maneira com que a caracterização dos seus personagens foi concebida. Parabéns pela sua incrível capacidade de expressividade. Beijos.

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  2. Realmente excelente comentário. Concordo! Adorei esta primeira parte. Acho infelizmente que foi pouco divulgado, apesar dos dados da audiência. Quase ninguém que conheço estava sabendo ou viu. Estranho não?
    Abraços!

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